2 de novembro de 2010

Você deixou que o medo a dominasse.

– Lúcia! – chamou Susana, baixinho.
– Que é?
– Agora estou vendo Aslam. Desculpe-me.
– Não tem importância.
Mas sou muito pior do que você pensa. Acreditei que era ele... acreditei ontem mesmo... quando ele não queria que fôssemos pelo pinhal. E acreditei também hoje, quando você nos acordou. Isto é... no fundo acreditei... Ou podia ter acreditado, se quisesse... Mas estava com tanta pressa de sair da floresta... e... não sei como vou explicar. O que vou dizer a ele agora?
– Talvez não precise dizer mais nada.
Não tardou que se encontrassem junto das árvores e vissem através delas o Monte de Aslam, construído sobre a Mesa de Pedra, já tempos depois do tempo deles.
– A guarda não está no posto – resmungou Trumpkin. – Já deviam ter barrado a nossa marcha...
– Psiu! – fizeram os outros quatro, porque Aslam parará e, tendo-se voltado, olhava para eles com um aspecto tão majestoso que todos ficaram contentes, tão contentes quanto é possível a pessoas que sentem medo, e tão cheios de medo quanto é possível a pessoas que se sentem contentes. Os rapazes avançaram. Lúcia afastou-se para lhes dar passagem. Susana e o anão recuaram.
– Aslam! – exclamou Pedro, pondo um joelho em terra e levantando a pesada pata do Leão até tocar com ela no rosto. – Estou tão contente... e tão triste! Desde que partimos que os tenho trazido por caminho errado, e ontem foi pior do que nunca.
– Meu filho! – disse Aslam.
Depois voltou-se para Edmundo e deu-lhe as boas-vindas:
– Muito bem! – foram as suas palavras. – Depois de um silêncio terrível, disse com voz grave: – Susana! – Susana não respondeu e pareceu aos outros que estava chorando. – Você deixou que o medo a dominasse. Venha, deixe que sopre sobre você. Esqueça seus receios. Está melhor agora?
– Um pouco, Aslam – disse Susana.
– Pois bem! – continuou Aslam, em voz tão forte que quase parecia um rugido, fustigando os flancos com a cauda. – Onde está aquele anãozinho, esse famoso espadachim e arqueiro, que não acredita em leões? Aproxime-se, filho da Terra, venha aqui\ – A última palavra já não parecia um rugido, era quase um rugido de verdade.
– Com mil demônios! – murmurou Trumpkin, com a voz sumida.
As crianças, que conheciam Aslam o suficiente para perceber que ele gostava muito do anão, não ficaram impressionadas. Mas com Trumpkin, que nunca tinha visto um leão, e muito menos aquele, o caso foi diferente. Fez a única coisa sensata que poderia fazer naquele momento. Em vez de fugir, cambaleou na direção de Aslam, que se lançou sobre ele.
Você já viu alguma vez uma gata com o filhote entre os dentes? Pois foi muito parecido. O anão, encolhido num feixe miserável, pendia entre os dentes de Aslam, que o sacudia. A pequenina armadura tilintou como se fosse um guizo e em seguida... zztl... o anão foi atirado para o ar. Se estivesse na cama não estaria mais seguro, mas ele não se sentia assim. Ao cair, as enormes patas aveludadas envolveram-no como se fossem braços de mãe e depuseram-no no chão (com a cabeça para cima e os pés para baixo).
– Filho da Terra, seremos amigos? – perguntou Aslam.
– S... S... Sim! – respondeu o anão, ainda ofegante.
Príncipe Caspian, C.S. Lewis (pg 364-5 do vol. único)

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